Breve visita aos cantos do céu

E foi aqui, acima das nuvens, das próprias nuvens que eu recordo onde estive por uma vez apenas. Não em sonho, não por minha mente doentia, juro que sou mais saudável que aparento e que nunca seria capaz de imaginar tal extravagância antes mesmo de vê-la com os próprios olhos.
Foi repentino, e o manto branco esvoaçante e pomposo já esmigalhava-se perante o céu azul e límpido. Tudo tão claro e branco que fechei um pouco as pálpebras para apreciar. Apreciar o que? Apreciar o nada e tudo, porque aquilo era alguma coisa e coisa nenhuma ao mesmo tempo. Eu soube disso porque senti, e foi a primeira vez que senti algo depois de muito tempo.
O manto branco lembrou-me dos lençóis do mês de julho, tão lácteos, nas manhãs dos varais expostos, na terra. Estava sob tudo aquilo, desfeita completamente do inferno abaixo das nuvens. Tudo abaixo de tudo, como nas camadas de areia, desérticas como eu.
O sentimento de vida retomava meu profundo âmago de bicho entocado, o vento fluía forte ali, tão alto, tão alto. Ah! Eu me joguei! Finalmente libertada das hipocrisias, mentiras, ideologias. Fui caindo feito pássaro sem asas, suicida corajoso como sou. Mas fui caindo tão rápido, ao ponto de as palavras fugirem de mim, de me escapar o sentimento consumidor. Pensei “Meu Deus, e era pra ser assim?”.
Atravessei o manto branco, uma rocha, fiz um furo no abstrato do impossível inimaginável. Cambaleei pelas nuvens bobas, tentei agarrar-me à uma delas. Más! Nuvens tão impiedosas! Recusaram meu apelo, meus braços finos, e nada pôde segurar-me ali. Não era o local em que eu estava presa, inacreditável. Ouvi sussurros por toda a queda, como invasões. “Não és mais tão suicida assim, não?” Riram de mim? Ou foi apenas o vento a profanar perversidades pelos meus ouvidos? Das poucas certezas que achei que tivesse, fui despida friamente como num encontro brutal... Sei que a atmosfera inteira penetrava em minha pele, ouvidos, boca e olhos. Fogo! Fogo!
Antes de esparramar-me pelo chão, lembro de uma ultima olhada para o lençol branco agora tão distante. Havia sumido, se desfeito como neve desfalece em água, que evapora sem sentido algum. Não havia varal, nem lençóis, o mês era outubro.
E por mais que meu corpo gritasse de medo por dentro, consumindo o antes sentimento de vida que era pura mentira e miséria, o coração estava à favor da dependência, solene e fiel como sempre (mais dependente de mim que eu dele), recusei apelos externos, internos, e minha ciência num ápice de misericórdia sentiu-se agradecida com aquilo.
Incrivelmente ainda estava viva, minutos bônus para um ultimo suspiro de consciência. Talvez o manto fora mesmo para mim, talvez. O mais estranho foi ter saído do bueiro e voltado para o mesmo tão bruscamente. Então era aquilo que chamam “céu”?
Se for, não encontrei Deus, tampouco fui bem-vinda.

Comentários

  1. Ahhh postou o texto que tava me falando. *--*
    -------------------
    @post: essa pessoa se jogou mesmo. O que ainda não entendi era onde essa pessoa estava...
    Anyway, gostei do texto. Depois você vai explicá-lo para mim. u.u
    Kissus :*

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  2. Lembrei-me de um fato em que uma menina se joga da sacada do seu quarto num desses prédios ali na Ponta D'Areia.

    Gostei, parece que estava vendo tudo como um filme paralelamente a ação de ler.

    Paz!

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  3. Me fez pensar em várias coisas... suicídio, experiência de quase morte ou só um delírio. Bem escrito, gostei! xD

    Ps: respondendo ao teu comment lá na Caixa kkk
    Esse homem tá aqui e vai casar comigo kkkkkk *_*
    O que aconteceu no final foi o "se". Cada um interpreta como quiser. Pra mim, seria "se ele estivesse aqui" xD
    E é realista por que faz parte do que vivo e quero viver ainda. Coisinhas minhas com ele.

    Beijo! ^^

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  4. Uma Grande queda, rapida e direta, mas digo, nunca voltamos a cair no mesmo lugar.

    Otimo Texto!
    Grande Abraço!

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